quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

O QUE FAZER EM MOMENTOS DE CRISE ?

Participei de uma palestra com empresários da Serra da Ibiapaba, há alguns meses, e na ocasião fui entrevistado por uma rádio local para um programa sobre a adaptação e mudança das empresas e seus gestores em épocas de crise. A íntegra do que eu disse você encontra aqui.

Rádio: De que forma as empresas devem encarar os momentos de crise de todo o mercado de atuação?



Paulo Ávila: Momentos de crise sempre existiram e sempre vão existir. Eles permitem o saneamento do mercado, pois é na crise que desaparecem empresas que não conseguem se adaptar, as que conseguem permanecem e outras surgem com inovações que vêm criar novos paradigmas de mercado. 

Às vezes a crise surge em função de exigências externas, como a escassez de algum insumo usado na fabricação do produto, como está acontecendo cada vez mais com as madeiras nobres, por questões de legislação, como o veto que tramita no governo argentino para calçados brasileiros ou por uma redução na demanda, como acontece com a indústria do tabaco. 

Empresas criativas estão buscando novos materiais para substituir a madeira, indústrias de cigarro estão adquirindo fábricas de alimentos e tenho certeza de que a indústria de calçados já está buscando alternativas para substituir a exportação para a Argentina. 

A indústria leiteira no Brasil é um exemplo de um segmento que passa por sua pior crise dos últimos 13 anos pelo excesso de produção e baixo preço do leite importado, mas alguns já estão se movendo, deixando de vender o leite como commodity para transformá-lo em produtos derivados, com maior valor agregado.

Alguns produtos que enfrentaram ou enfrentam proibição em virtude da legislação, exigindo um reposicionamento das empresas e produtos que os fabricam hoje são o álcool líquido para uso doméstico, o insufilm para vedar vidros dos automóveis, a propaganda de cigarros que no passado era carro-chefe de muitas agências, os transgênicos em alguns países, armas de fogo e munições etc. Cada uma dessas indústrias está passando por mudanças para sobreviver.

Enfim, a história está cheia de casos em que forças externas obrigaram empresas a um reposicionamento, da abolição da escravatura e o conseqüente impacto em toda uma indústria dos tempos coloniais, até a simples mudança de mão de uma rua, que obriga o Zé do boteco a fechar as portas ou partir para outra com o desaparecimento da clientela.

Rádio: Qual a principal/primeira medida a ser tomada para a empresa não entrar em crise junto com o mercado?



Paulo Ávila: A primeira medida é nunca ter todos os ovos na mesma cesta. Qualquer que seja a empresa e o segmento, é preciso uma estratégia de desenvolvimento de novos produtos e de exploração de novos mercados, uma espécie de departamento de investimentos no futuro. Isso permite que a empresa não seja surpreendida por alguma mudança brusca nas regras do jogo onde está inserida. 

Antigamente uma empresa começava com o avô e aquilo ia até os netos fazendo a mesma coisa do mesmo jeito. Hoje isso é impossível. Lembro-me de ter lido de uma empresa norte-americana que, no fim da guerra do Vietnã, deixou de fabricar bombas para fabricar brinquedos. 

Uma mudança radical assim só é possível para empresas de visão e que tenham sua estrutura montada em formato de um parque de diversões, que está sempre pronto a viajar e a mudar sua configuração e seus produtos dependendo do mercado nas diferentes cidades por onde peregrina. Esse monta-desmonta, seja ele conceitual, de negócio ou de produto, é uma habilidade que toda empresa precisa procurar ter nos dias de hoje.

Outra medida é de atitude. Boa parte do fracasso está na inércia e naquele destrutivo sentimento de auto-piedade que perde tempo procurando colocar a culpa nos elementos externos ao invés de sair em busca de novas ideias. A luta pela manutenção de um mercado de forma artificial, como às vezes é feito com mecanismos como reserva de mercado, subsídios e outros dispositivos artificiais pode ser um tiro pela culatra no longo prazo. O mercado é implacável demais para permitir que algo sobreviva sem uma função clara e competitiva.

Um amigo foi perguntado por um empresário, que modernizou a empresa com um novo sistema de gestão, atendimento de pedidos e suporte ao cliente computadorizado, quais as pessoas escolher para uma redução de seu quadro. Meu amigo foi rápido na resposta. "Dê uma volta pela empresa e observe cada colaborador. Aquele que não estiver sentado na frente de um micro você dispensa". Naquela empresa tecnologia da informação é sinônimo de eficiência, portanto ficou fácil descobrir quem trabalhava com eficiência e quem não. Desnecessário é dizer que alguns dinossauros que se recusavam a se adaptar aos novos tempos acabaram na rua.

O mesmo tratamento vale hoje principalmente para empresas familiares quando um sem número de parentes nem sempre produtivos ficam pendurados em sua estrutura e sugando recursos. Em um mercado competitivo como este já não há mais espaço para deixar as coisas caminharem como estão. É preciso sanear e profissionalizar a empresa, aumentando sua eficácia e otimizando seus recursos.

Rádio: Algumas empresas demonstram crescimento durante a crise, diferentemente da grande maioria. A que fatores se devem esses resultados positivos?



Paulo Ávila: Visão é um deles. Habilidade de surfista é outro. O surfista não espera a onda chegar para deitar na prancha e começar a remar. Ele começa a remar quando vê a onda no horizonte, procurando sincronizar ao máximo a velocidade da prancha com a onda que vem chegando. Se não fizer assim ele perde a onda. Você não vê o desvio ou a saída da estrada se dirigir olhando para o painel do carro. É preciso olhar as placas, os sinais do novo rumo e ir se preparando, procurando no horizonte um indício de que está chegando a hora de mudar.

Rádio: O momento de crise é o melhor momento de oportunidades? Por que?



Paulo Ávila: Eu diria que o momento da crise é a prova que revela quem estava de olho no futuro e quem dirigia olhando para o painel da própria empresa, no carro da frente ou, o que é pior, para o retrovisor, preocupado com o sucesso ou fracasso — principalmente o fracasso — de sua concorrência. 

A maioria das empresas costuma dirigir assim, deslumbradas com o próprio painel de desempenho, seguindo religiosamente a empresa que está na frente e comparando-se, até para satisfação própria, com as que vê pelo retrovisor. Não é de surpreender que geralmente a crise não leve apenas uma empresa de um determinado segmento para o buraco. Uma acaba seguindo a outra, exceto aquelas com estratégias independentes.

Rádio: Como o aspecto psicológico deve ser trabalhado para incentivar a equipe a vencer nesse momento turbulento?



Paulo Ávila: A melhor estratégia é franquear canais de comunicação verticais, porém não os descendentes — da chefia para a operação — mas principalmente os ascendentes — da produção para a direção. Não é raro encontrar na própria empresa o melhor caminho ou as melhores ideias, desde que a direção esteja pronta a ouvir seus colaboradores. A simples abertura de uma comunicação mais fluida, que inclui também deixar os colaboradores cientes da situação da empresa e do mercado, pode servir de motivação. 

Alguns discordam, achando que quanto menos a equipe souber da crise, melhor é. Como a crise não está sujeita à empresa, mas o contrário, deixar que os colaboradores descubram na última hora, quando a vaca já está com meio corpo no brejo, não irá ajudar em nada. Uma empresa é formada por pessoas e informação é a maior arma para enfrentar a crise, tanto a informação que circula de cima para baixo como de baixo para cima.

Rádio: Você poderia citar algumas medidas objetivas para superar a crise?



Paulo Ávila: há bem da verdade não existe remédio rápido, do tipo dez mandamentos, para a crise. O que existe é uma série de boas ações que deveriam existir em todas as empresas com ou sem crise. Empresas com uma estrutura já configurada para mudar — lembre-se do parque de diversões — sempre terá maior facilidade de enxergar oportunidades a cada momento de crise. Dentre muitos outros aspectos que variam de empresa para empresa, eu sugiro uma especial atenção a estes:
·      Tenha bem claro o objetivo e visão da empresa
·      Desenvolva um plano estratégico de comunicação e marketing para a empresa e faça revisões periódicas.
·      Explore ao máximo as competências da empresa e as habilidades de sua equipe
·      Invista nas pessoas, principalmente na contratação de novos talentos, reciclagem dos existentes e exclusão daqueles que de difícil adaptação a mudanças
·      Crie uma cultura organizacional visando levar a equipe a enxergar a empresa não como um emprego, mas como parte integrante de sua vida.
·      Não economize em tecnologia e treinamento.
·      Facilite uma cultura de empowerment para que cada um se sinta dono do seu pedaço ou das tarefas que lhe são designadas.
·      Abra um canal de comunicação ascendente e esteja pronto a escutar o que os colaboradores pensam da empresa, do produto e dos serviços.
·      Estimule a criatividade entre sua equipe, criando desafios de melhoria contínua e recompensando as melhores idéias.
·      Dissemine a cultura de organização aprendiz para que cada membro da equipe seja capaz de enxergar oportunidades de mercado.

Rádio: Há quanto tempo você trabalha com gestão de mudanças e oportunidades?


Paulo Sérgio Ávila
Especialista em Gestão de negócios
CEO - Mais Comunicação


Paulo Ávila: Minha atuação não é exclusiva a gestão de mudanças e ficaria difícil definir uma data. Se fosse definir, eu diria que trabalho com gestão de mudanças desde quando saí da faculdade de Marketing. O simples fato de eu ser mercadologista e hoje não estar atuando só em marketing já mostra o quanto precisei mudar ao longo de mais de 25 anos de atuação em diversas profissões e mercados. Quem não sabe mudar a si mesmo para manter a cabeça fora da água terá dificuldade para mudar qualquer coisa, seja a empresa, o produto ou o serviço.